terça-feira, 21 de abril de 2009

O SENHOR DOS ANEIS E A SOCIEDADE DO ANEL


Numa terra fantástica e única, chamada Terra-Média, um hobbit (seres de estatura entre 80 cm e 1,20 m, com pés peludos e bochechas um pouco avermelhadas) recebe de presente de seu tio o Um Anel, um anel mágico e maligno que precisa ser destruído antes que caia nas mãos do mal. Para isso o hobbit Frodo (Elijah Woods) terá um caminho árduo pela frente, onde encontrará perigo, medo e personagens bizarros. Ao seu lado para o cumprimento desta jornada aos poucos ele poderá contar com outros hobbits, um elfo, um anão, dois humanos e um mago, totalizando 9 pessoas que formarão a Sociedade do Anel.

COMENTARIO:

Considerado gênio por alguns, J.R.R. Tolkien não imaginava a revolução que causaria na literatura quando publicou, na década de 30, o livro O HOBBIT, aventura infanto juvenil passada num lugar anterior à Terra como conhecemos hoje. Depois do estrondoso sucesso da obra, Tolkien (que, na verdade, era um lingüista), dedicou 12 anos de sua vida à construção detalhada do que seria a sua maior obra: O SENHOR DOS ANÉIS, épico dividido em 3 volumes e que narra fatos posteriores à O HOBBIT. O sucesso foi ainda maior. Depois de algum tempo, com o surgimento do movimento Hippie (que venerava a obra do escritor inglês), O SENHOR DOS ANÉIS se consolidou como uma das maiores obras da literatura mundial, e foi escolhido o melhor livro inglês de todos os tempos. Portanto, uma adaptação cinematográfica era mais do que certa. Pena que a primeira tentativa de transpor a Terra-média para os cinemas foi a malfadada versão animada de Ralph Baksh (realizada em 1978), que evaporou com o espírito da obra, infantilizou personagens e gerou revolta por partes dos fãs mais exaltados. Mas o diretor Peter Jackson, um fanático pela obra de Tolkien, não se conteve. Dedicou vários anos de sua vida à um projeto caro, arriscado e que poderia mudar a história do cinema para sempre. Depois de conseguir sinal verde da New Line (e com algumas centenas de milhões de dólares em caixa), Jackson começou a dar forma à aguardada versão live-action de O SENHOR DOS ANÉIS. Com um roteiro assinado por ele, Frances Walsh e Philippa Boyens, o diretor estava pronto para este imenso desafio, sem dúvida um dos maiores que um diretor de cinema poderia enfrentar. Filmar os três filmes da série ao mesmo tempo era, no mínimo, ousado. Se o primeiro fracassasse os outros acompanhariam o fiasco, e assim Jackson afundaria sua carreira (junto com o estúdio). Era uma hipótese a ser considerada, mas que agora desaparece quando conferimos o resultado de "O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel", o primeiro (e maravilhoso) filme da trilogia . Por ter mais de 400 páginas, a tarefa de adaptar A SOCIEDADE DO ANEL para as telonas não era das mais fáceis. Alguns personagens precisariam ser cortados, outros ganhariam espaço, passagens do livro deveriam ser ignoradas... É claro que os fãs mais radicais protestaram, mas a verdade é que as mudanças adotadas pelo diretor são extremamente positivas e úteis. O roteiro de "A Sociedade do Anel" é um primor de adaptação. Além de conseguir manter a alma da obra de Tolkien intacta, o filme ainda desperta o interesse do público que desconhece os livros do inglês. Preservando as passagens mais importantes e apagando outras desnecessárias, "A Sociedade do Anel" ganha muito em fluidez da narrativa, que não apresenta furos e nunca se mostra quebrada. Assim como no livro, os personagens e a trama são apresentados ao público logo no início (o que toma mais ou menos uma hora de projeção), dando espaço para a ação e emoção nas duas horas seguintes. Algumas pessoas chegaram a reclamar de uma certa lentidão no início, mas era impossível iniciar a história sem deixar o espectador a par de tudo o que está acontecendo na Terra-média. O desenvolvimento inicial dos personagens é excelente, e contribui muito para os resultados que o filme alcança no final. A história, mais conhecida agora, é rica em detalhes (e por isso difícil de ser resumida em poucas linhas). Sauron, O Senhor do Escuro, forjou vários anéis mágicos e os distribuiu aos povos da Terra-média. Logo em seguida, criou o Um Anel, jóia que controla todos os outros anéis e, conseqüentemente, os povos do continente. Numa batalha, o Rei humano Isildur se apodera da jóia, mas logo a perde. Ela vai parar nas mãos de uma criatura de nome Gollum, que acaba sendo corrompida pelo poder do anel e o perde, num jogo de charadas, para o hobbit (criatura parecida com humanos, mas de baixa estatura e com pés peludos) Bilbo Bolseiro (Ian Holm). No seu aniversário, Bilbo resolve desaparecer por algum tempo e deixa, aconselhado pelo mago Gandalf (Ian McKellen), o Anel para seu sobrinho, Frodo (Elijah Wood). Mas o Senhor do Escuro começa a juntar forças novamente e manda seus Cavaleiros Negros (reis-homens que foram corrompidos pelo anel) atrás do pequeno Frodo. Assim, o hobbit (que por direito tem a posse do anel) é encarregado de levá-lo o mais depressa possível até a cidade de Valfenda, onde um conselho decidiria o futuro da jóia. Ele é acompanhado pelos hobbits Sam Gamgi (Sean Austin), Pippin (Billy Boyd) e Merry (Dominic Monagham), e no caminho encontra o misterioso Aragorn (Viggo Mortensen), amigo de Gandalf. Chegando em Valfenda, uma Sociedade é incumbida de levar o Um Anel até a Montanha da Perdição, o mesmo local onde fora forjado por Sauron. Assim,o pequeno grupo se transforma na Sociedade do Anel, que agora conta com o anão Gimli (John Rhys-Davies), o elfo Legolas (Orlando Bloom), o humano Boromir (Sean Bean) e Gandalf para cumprir a missão e salvar a Terra-média das sombras. O caminho é dos mais atribulados, pois a Sociedade precisa enfrentar os perigos naturais do continente, além dos orcs enviados por Sauron e pelo mago traidor Saruman (Christopher Lee). As alterações, que preocupavam tanto os mais fanáticos, são mínimas (mas muito bem pensadas),. A exclusão do personagem Tom Bombadil, que no livro só cantava e dançava e não tinha grande relevância, foi a decisão mais acertada, pois isso confere agilidade à narrativa (que não poderia perder o ritmo em momento algum, já que se trata de um filme com 3 horas de duração). Além disso, a elfa Arwen (Liv Tyler) ganhou maior destaque no filme de Peter Jackson, pois este queria uma maior participação das mulheres na película. Além, é claro, de Arwen ter um romance com Aragorn, situação que tem pouco espaço neste "A Sociedade do Anel", mas deve ser mais explorada nos outros filmes. Alguns outros detalhes foram alterados, mas nenhum deles merecem ser tão analisados quanto estes já citados.
O elenco é um dos maiores pontos positivos do filme. Elijah Wood nasceu para o papel de Frodo, e deve ficar marcado como o pequeno herói de pés peludos. As cenas onde ele se sente atraído pelo Anel são o ponto alto da interpretação do jovem ator. Sean Austin é outro que está perfeito na pele do bravo e corajoso Sam Gamgi, que faz de tudo para proteger seu amigo Frodo. Dominic Monagham e Billy Boyd formam a dupla Merry & Pippin, o alívio cômico do filme. Ambos estão muito engraçados, e idênticos ao jeito descrito por Tolkien em sua obra. Ian McKellen é outro que parece ter nascido para seu papel (o mago Gandalf). O ator transmite todo o carisma do personagem (característica que também aparece nos livros) e dá um banho de interpretação nas cenas mais dramáticas.
Liv Tyler está muito bem como Arwen, e apesar de sua pequena participação, consegue o melhor papel de sua carreira. Viggo Mortensen se dá bem como Aragorn, e consegue dar o tom certo (mistério e liderança) ao personagem. Já Christopher Lee volta aos velhos tempos e assusta e causa arrepios como o mago Saruman. Ian Holm é um dos melhores em cena, e cónstroi um Bilbo divertido e falastrão, e em algumas ocasiões, sério e assustador. Merece, ao menos, uma indicação ao Oscar, assim como o excelente Sean Bean (no complicado papel de Boromir). O ator tem a interpretação mais marcante de "A Sociedade do Anel", e vai arrancar lágrimas de alguns nas cenas finais. E, surpreendentemente, a única que parece deslocada em cena é a talentosa Cate Blanchett. Sua personagem (a rainha-elfa Galadriel) está mais assustadora e sombria do que o necessário. Culpa da atriz (que exagerou em uma cena-chave) e do roteiro (que não trabalhou muito bem a complexidade da personagem). Mas, convenhamos, um erro ínfimo num filme tão gigantesco.
A direção de arte de "A Sociedade do Anel" é outro dos pontos altos do filme. O Condado (lugar onde vivem os hobbits) é extremamente fiel à descrição de Tolkien. Está tudo lá: as portas e paredes arredondadas, as colinas, as flores, os campos... A torre de Orthanc (moradia de Saruman) é gigantesca e impressionante, com um interior gótico e sombrio. Valfenda é o melhor momento da direção de arte do filme. Desde a beleza das paisagens (com direito a várias cachoeiras) até os mais pequenos detalhes, a cidade onde acontece o conselho de Elrond é deslumbrante, de visual único. As minas de Moria (minas construídas por anões e encravadas dentro de uma cadeia de montanhas) são mostradas em toda a sua grandeza.Sustentadas por milhares de pilares, e interligadas por gigantescas pontes, as minas concentram a maior parte dos momentos eletrizantes do filme. Isso sem falar na espetacular e bela floresta de Lothlórien, onde vive a rainha Galadriel. Os efeitos especiais da WETA (te cuida, ILM !) são espetaculares, mas usados com moderação e inteligência, nunca tentando tomar o lugar da história. Os cenários digitais são impossíveis de serem diferenciados de cenários verdadeiros, e os personagens criados em CGI são muito realistas. Destaque para Gollum (te cuida, Jar Jar Binks !) e para o temível Balrog (que é muito maior e perigoso do que você pode imaginar). A fotografia de Andrew Lesnie também é das melhores. Dá ao filme um tom sofisticado e elegante, e consegue driblar facilmente os diversos momentos passados no escuro. E a trilha sonora de Howard Shore, apesar de não conter nenhuma música "assobiável" (como o tema de Star Wars ou de Indiana Jones), é esplêndida, e cresce muito na segunda metade do filme. Em matéria de apuro visual (e auditivo), o filme de Peter Jackson é um espetáculo. Mas, e a emoção, a aventura, o drama ? Eles têm lugar em num filme tão gigantesco como "A Sociedade do Anel" ? É óbvio que sim. O livro de J.R.R. Tolkien já era maravilhoso na medida em que proporcionava uma aventura inesquecível e cheia de detalhes ao leitor. O filme de Peter Jackson segue na mesma linha. Nunca se viu tamanha quantidade de cenas emocionantes num mesmo filme. As cenas mais estonteantes se passam dentro de Moria. A queda de Gandalf, junto com o Balrog (que, aliás, está muto assustador) e a fuga da Sociedade na escadaria em ruínas já estão, de cara, entre as melhores do ano. Sem contar com a cena do maravilhoso duelo entre Gandalf e Saruman, a cena dos Cavaleiros Negros perseguindo a Sociedade na estrada (um momento de extremo silêncio e tensão, onde não se ouvia um suspiro dentro do cinema) e o avassalador final, digno de lágrimas e aplausos. Tudo ajudado pela vertiginosa movimentação de câmera do diretor, que joga o público no meio das batalhas e dá rasantes de tirar o fôlego. Ainda merece um grande destaque o prólogo, narrado por Galadriel de forma explicativa e mística. Essa parte foi adicionada ao filme para que todos (leitores ou não de Tolkien), pudessem compreender perfeitamente a história. E é o que acontece. É necessário dizer que o filme não tem um final definido, pois a história continua em "As Duas Torres" e só termina mesmo em "O Retorno do Rei". Por causa disso, vá preparado para sentir uma inevitável (e deliciosa) ansiedade pelo próximo capítulo quando os letreiros deste filme começarem a subir. O diretor Peter Jackson, então, cumpre sua missão de maneira soberba e apaixonada, e ainda consegue imprimir em "A Sociedade do Anel" belas e sinceras lições de esperança, amizade (um personagem defende a vida do outro com paixão e coragem - o maior exemplo disso é Sam, defensor de Frodo) e vida (como aquela que Gandalf ensina à Frodo, logo após os dois adentrarem o portão de Moria), que também estavam presentes na obra de Tolkien. O diretor mantém viva a magia da Terra-média, e transforma esta primeira parte da saga numa das primeiras obras-primas cinematográficas do começo do século XXI. Enfim, já entrou pra história.

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